Jornalista conta como deixou emprego, família e amigos para viver uma nova cultura em Lisboa, Portugal
Viajar sempre foi uma das minhas paixões. Talvez tenha crescido por influência dos meus pais, que desde criança me levaram para aventuras memoráveis.
Lembro de ir do Rio de Janeiro à Bahia num trailer acampando em praticamente todas as praias nativas. Ali, conheci a verdadeira costa do estado do Rio, Espírito Santo e Bahia até chegar a Cabrália.
Comecei a viajar para o exterior quando completei 15 anos. O primeiro país que conheci foi os Estados Unidos. Aos 17, já era uma atleta profissional, foi quando embarquei para a Austrália e fiquei por dois meses treinando para o Mundial de Triathlon.
Mergulhei no universo de 30 países, cada um com sua particularidade. O aprendizado é enorme em cada cultura que você conhece. É uma verdadeira descoberta, fico pensando em como aquelas pessoas conseguem viver e como encaram a vida.
O último país que me deixou bastante reflexiva foi a Tailândia. Como eles lidam com a fé e a culinária é completamente diferente do nosso mundo. O cheiro, o jeito das pessoas, tudo que você vê e sente faz refletir e pensar como as culturas são extraordinárias, são sem fronteiras e não existe o certo ou o errado.
Quando o rei da Tailândia morreu eu estava na principal ilha do país, a mais turística Phi Phi. Naquele momento, vi que a cultura era completamente diferente da nossa e precisávamos respeitar aquele momento deles. Foi incrível ver e apurar aquilo tudo.
As pessoas chorando na rua, acendendo velas, esticando a bandeira do país. Colocavam a foto do rei na frente das casa e rezavam muito. As notícias da imprensa diziam que o luto duraria um ano! Essa experiência me fez ver a fé de outro ângulo, a ser mais tolerante com as diferenças.
Mas a grande mudança na minha vida aconteceu dia 3 de novembro de 2016, quando decidi embarcar para Lisboa e deixar pra trás meu emprego na Rede Globo, minha família e amigos. No passado, tentei fazer dois intercâmbios que não deram certo. Apenas fiquei na Austrália durante dois meses e morei em San Francisco nos EUA por 50 dias na casa de uma família americana para aprender Business English. Foi o máximo que consegui.
Dessa vez meu momento pessoal de vida estava propício e nada me prendia. Me joguei literalmente pra ver o que a vida ia me proporcionar. A pós-graduação em Comunicação Digital era o foco principal. Mudei minha rotina e saí da zona de conforto.
Voltei a estudar. Não trabalhava e morei durante três meses na casa da mãe da minha melhor amiga, a tia Betinha (que me recebeu em Sintra!). Era uma casa com duas culturas: portuguesa e brasileira.
O marido dela, o Marco, me ensinou tanta coisa quando cheguei. Descobri que a nossa língua aqui é brasileiro e a deles é o português. O jeito de cozinhar era diferente, a gente ia no vizinho de roupão, o inverno era frio e chovia, a casa não tinha aquecimento e a compra no mercado era com o celular na mão para perguntar o que significava diospiro, gourget, pão ralado, cacete, cuecas, bica, entre outras expressões que eu ouvia e não fazia a menor ideia o que eles queriam dizer.
O primeiro dia na sala de aula me deixou tensa. Quando o professor começou falar Vanessa pra cá e pra lá e eu não conseguia entender que ele estava fazendo referência pra me apresentar pra turma!
Foi quando comecei amizade com a Nádia Barroso, uma portuguesa gente boa que me disse “nós somos formais, nunca fale com o professor chamando-o de você ou tu”. Aqui é íntimo.
Assim que cheguei também decidi colocar em prática um projeto pessoal antigo. Sempre que viajava ficava pensando no estilo de vida das pessoas de diferentes culturas. Foi aí que decidi lançar um blog, o Tripper Talks.
Comecei a estudar a forma de torná-lo mais relevante em termos de conteúdo e cheguei a conclusão que precisava fazer um canal sobre as riquezas de Portugal sob um ângulo de alguém que veio viver aqui e quer compartilhar suas experiências e descobertas, tornando-se referência para quem quer vir para Portugal a passeio ou simplesmente pra morar.
O blog ganhou alguns seguidores e já quase completando sete meses. Durante esse tempo aprendi tanta coisa que não imaginava que eu era capaz, como editar vídeo, narrar, fazer off, cortar imagens, fazer um site, monitorizar e analisar tudo através dos números e planejar a partir dos resultados. Virou um negócio pra mim e é minha tese final da pós-graduação.
Depois de três meses na casa da tia Betinha decidi me mudar pra Arroios, numa casa compartilhada em que eu tenho meu quarto privado, mas divido o banheiro com um espanhol e a sala e cozinha com mais uma amiga brasileira e um angolano. As diferenças gritam às vezes no dia a dia, mas é adaptável.
Lisboa tem vários parques, praças e muitos lugares arborizados para a prática esportiva. Inclusive me inscrevi em grupos de redes sociais chamados Meet Up, que tem bastante evento de todos os tipos. Já conheci bastante gente e aprendi muito.
O contato com os portugueses é bastante tranquilo, apesar deles serem mais formais e fechados. Você aprende a respeitar e a ganhar aos poucos a confiança das amizades. Eles são doces, legais, te ajudam e eu não tenho o que reclamar de ninguém por aqui.
Minha turma da faculdade é bué fixe, gira e todos me respeitam! O único preconceito que vi e senti foi do homem português com a mulher brasileira, que tem uma “fama” ruim por conta do passado. Sabe aquele ditado: levei a fama sem deitar na cama? Então é exatamente isso porque fato é que realmente rolou uma galera mal intencionada por aqui. Neste caso aprendi a me impor, não dar mole pra preconceituosos e quando sinto no ar uma desconfiança corto o nó pela raiz. Tem dado certo (kkkkk)
Depois de quase sete meses na terrinha a única coisa que digo que é muito difícil até hoje é lidar com a saudade da família, dos amigos e do meu emprego na Globo.
Sofro ainda com isso, mas vai passar. A distância e esse tempo sem trabalhar numa empresa me fez um bem danado, pois a lista das coisas que não quero mais na minha vida cresceu. Aprendi a me valorizar, a me amar mais, a selecionar quem entra na minha vida pra somar. Aqui fiquei mais sensível, mais emotiva, mais humana.
Conclusão sobre a minha mudança radical de vida: não quero voltar, só quero descobrir mais, ter a oportunidade de aprender mais dessa cultura linda europeia para conseguir visualizar o mundo sob outro ângulo, outra dimensão, de uma forma mais tolerante a tudo e a todos.
Não quero nunca mais parar de viajar! Não quero nunca mais parar de fazer a minha terapia, seja sozinha ou acompanhada! Conselho: viaje pra onde você puder, até para o lugar mais improvável. Lá existem pessoas e histórias e, consequentemente aprendizado, troca. Não perca essa maré, reme e drope a sua onda perfeita.
* Texto de Vanessa Asturiano, jornalista que deixou tudo para trás e embarcou para Portugal para conhecer uma vida mais leve e cheia de descobertas.
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