Viajar sempre foi um grande prazer e por morar no interior do Rio Grande do Sul. Desde muito pequena, fui acostumada a passar horas dentro de um ônibus para visitar minhas parentes que moravam na capital. Com o passar dos anos os destinos foram se diversificando e as viagens deixaram de ser intermunicipais para conhecer outros estados e até outros países.
Cresci ouvindo que aos 30 anos teria que ter emprego fixo, estabilidade e casa própria. Ao completar 20, estava iniciando a faculdade de jornalismo e correndo contra o tempo. Nos 25 iniciaram minhas dúvidas junto com tratamentos para entender sobre tudo, principalmente o que eu queria fazer da minha vida. Depois de muitas conversas, crises de choro e incertezas, decidi que comemoraria meus 30 anos em uma viagem inesquecível. Não importava o que eu tinha ou o que me faltava, eu queria guardar lembranças.
No dia 6 de agosto embarquei de coração aberto para o sul da França, esperando que o mar da Côte d’Azur e os temperos da Provence me mostrassem o caminho certo a seguir na próxima década. Foram dias espetaculares apreciando desde paisagens luxuosas como as de Mônaco às simples e naturais como as Gorges du Verdon. A única preocupação era colocar no GPS o próximo destino e torcer para que o novo dia deixasse ainda mais memórias.
O mar da Costa Azul é realmente estonteante e até mesmo as pedras, que lá são a nossa areia, servem de ensinamento quando se está aberto a aprender. Não existe mérito sem esforço e se você não usar os sapatos adequados, pode ter certeza que entrar naquele mar pode ser bem dolorido. A receptividade das pessoas, o respeito e a volta por cima, de uma região que ainda lembra do terror sofrido no verão de 2016 eram ensinamentos valiosos. Tentava absorver tudo e respirava fundo como num ímpeto de que tudo isso entrasse pelo ar.
A Provence despertou em mim a simplicidade, que andava adormecida. A vida que tinha lá no interior, calma e sem atropelos, onde tudo tem seu tempo. Queria ver a colheita da lavanda, mas o lugar me fez entender que passar da hora também é bom, pois as videiras e oliveiras pode ser tão bonitas quanto. Observei um carrossel cheio de crianças, enquanto degustava uma taça de vinho, ao entardecer e sem querer, admirei o céu e descobri que nunca tinha visto um céu como aquele. Derramei lágrimas e imaginei que talvez Toquinho e Vinicius tenham se inspirado naquelas paisagens para compor Aquarela.
Eis que os 30 chegaram e hoje, de volta ao RS, não tenho emprego fixo, nem casa própria. Não vou mentir e dizer que isso tudo não é importante, é sim. Tem dias que até acordo desesperada, mas respiro fundo como respirava lá nas ruazinhas da França, lembro de tudo o que vivi naqueles dias e meu coração se tranquiliza. Mario Quintana já dizia: “Viajar é trocar a roupa da alma.” Hoje posso dizer que minha alma está em festa.
- Cibele Avendano é jornalista, conhece a Argentina, Uruguai, Portugal, França e Itália. O sonho de viagem dela varia conforme o dia em que acorda, mas a Costa Amalfitana está em seus pensamentos.